sábado, 21 de julho de 2012

que não é carta, mas sempre volta.

uma homenagem, um outro lado, a segunda versão de quem não se conforma e não concorda com última história de Lucas Bilk, As Cartas de Amor Sempre Voltam.





você pediu o cigarro com medo de pedir amor.

ah, e você queria amor.
você sempre quis.
só que ao contrário, sempre recebeu pontapés. empurrões. olhos roxos. arranhões. e ainda acham que podem te julgar - da tua dor tão forte e intrínseca, que vender o corpo já não fica tão sofrido assim. o que te dói mais, sempre ficou lá dentro. então, você nunca teve muito tempo pra reprovações alheias: você só chegou nessa sarjeta por causa do amor –

você amou.
amou e foi feliz, amou e se rasgou, amou e abriu o peito demais.
amou e se afogou.
você amou e se perdeu.
você amou e foi suprir tua abstinência de carinho numa seringa cheia de morfina.
você amou e só perdeu tudo.

você amou e agora se prostitui pra pagar tua droga porque um dia só sentiu saudade demais.

e depois de tudo, depois de se enfiar na lama até o fundo, depois de passar pela mão de meio-mundo, ele surge recusando teu boquete e querendo teu coração. falando do amor por você como se pudesse, como se coubesse.

o problema é que ele não sabe.
o problema é que ele te deu os cigarros, te olhou e enxergou teus olhos e a tua dor e só achou bonito.
o problema é que ele já te invadiu o peito, e não somente entre as pernas.

ah, e você se tranca. você se engole. você tem medo: você deixa a tua letargia esconder teu amor.

e ele acredita.
ele não sabe.
ele é poeta.
ele tem as mãos delicadas, os olhos sonhadores e a voz macia: ele não sabe nem de metade.

por isso você demonstra querer só a morfina que ele te paga – teu corpo é barato, mas teu carinho é caro.
ele te chama de vagabunda e sofre por você. ele te odeia cada vez mais porque te ama. então você sofre junto. você se rasga de vontade dele, mas tem medo. então, você se droga: agora se entorpece pra fugir dele e do amor.

ele só tem que entender que te amar é errado. é sujo. é pesado, delicado. ele só precisa te conhecer até as entranhas e enxergar todas as vísceras pra concluir que quer ir embora.

porque ele quer voltar pra casa, esquecer da tua cara, só escrever as tais das cartas - depois de se satisfazerem, eles te deixam o dinheiro e sempre vão embora.

e ele tem que ir. você precisa cuidar da sua vida, se vender na esquina, se viciar só na morfina. ele só precisa ir embora e fazer tudo isso acabar. levar o amor junto dele, pros teus versos, guardar o lirismo só pra ele.

então você faz de tudo pra que isso acabe. você quer que ele te odeie e saia da sua vida. porque mesmo que ele fique, quem vai cuidar da tua dor depois ?

você é só a puta desgraçada que encantou a vida dele sem emoção com os teus espinhos vulgares. e uma hora, ele cansa, vai embora, desaparece. e você vai amá-lo até depois que ele virar as costas. mas os espinhos, estes vão permanecer selvagens.

até porque, você o ama mas não acredita mais em você mesma. já sabe que não vale a pena. sabe que é só amargo. já conhece toda a cena.

e no fim, só te resta teu corpo vendido e machucado. só te sobra agradecer à morfina, por te tirar do mundo e te esquentar todo dia.

e desprezar todo o resto.
porque desse mundo, você só recebeu amor estragado.

3 comentários:

Versos que eu fiz e ainda espero respota disse...

...foda

Marcelo R. Rezende disse...

Mas porque a gente recebeu amor estragado é que há que se dar valor quando um cara recusa o boquete e quer o nosso amor.

Linda tua carta, mesmo, entendo as tristezas e as dores. Entendo os entremeios. A gente cris um invólucro incrível depois de levar tanto na cara. É natural. Mas abrir-se para as possibilidades, mesmo que tão estranhas às nossas experiências anteriores, é sensacional.

Viva, Verônica, os amores que a vida te dá.


E eu não sei qual das cartas eu mais amo!

Beijo!

Brunno Lopez disse...

Como sempre, muito itenso.
Talvez, um pouco mais do que os outros.

Algo mais visceral, grandioso.

De qualquer forma, seu.